Livre Arbítrio, Reclamações & Sabedoria

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Há um bom tempo não escrevo artigos por aqui.. E hoje, sob a regência da Imperatriz, fui totalmente envolvida por questionamentos em um momento que foi puro reflexo deste Arcano: enquanto eu fazia compras no supermercado, depois de um dia puxado na escola e antes de chegar em casa e concluir uma consulta por email. Esta junção entre a mulher que tem profissão e a mulher que tem uma casa para administrar é a cara da Imperatriz.

Foram sete bolsas, algumas delas bem pesadas. As mãos estavam doloridas e o corpo cansado. Um pensamento veio a galope! Lembrei das palavras do meu filho, na época com 9 anos, diante da minha tentativa frustrada de abrir um portão pesado, debaixo de chuva e da minha reclamação hidratada em lágrimas (eu havia me separado do primeiro marido há poucos meses) "que droga! Por que eu não tenho força?!" Ele me disse assim, capricornianamente: "você quis se separar, agora não tem um homem forte para abrir o portão".

O tempo passou e eu casei novamente, e descasei outra vez... E, em um primeiro momento, pode mesmo parecer que ter um homem ao lado, ter um marido, resolve muitos problemas, especialmente aqueles que envolvem a necessidade de força física ou altura, ainda mais para quem tem 1.57m, como eu. No entanto, se eu olhar para o passado, é fácil perceber que nos 20 anos em que estive casada, somando os dois relacionamentos, esta presença masculina acolhedora e protetora era mais ficção do que realidade.

Ter um marido ou não pouco importa quando somos mulheres em um tempo em que nos cobramos independência, seja pessoal, material, emocional ou mental. E os homens, por sua vez, percebendo isso, foram se acomodando pouco a pouco. Descobrir o culpado é bobagem... Até porque, pelo que posso perceber, homens e mulheres andam insatisfeitos com as relações. É como se algo estivesse fora do lugar, mas ninguém percebesse, exatamente, o que.

Caminhando pela rua até o carro, pensei que tudo nesta vida é questão de escolha, o tal livre arbítrio, e que talvez carregar bolsas pesadas fosse um preço justo a se pagar pela autonomia, pela liberdade de decidir o que fazer e quando fazer.  Ao mesmo tempo, percebia que dentro de mim havia um monte de pontos de interrogação. O que eu quero de verdade? Lembrei de todas as vezes em que fui ao supermercado com meu namorado. Ele sempre se apressa em pegar todas as bolsas, sim, ele é um homem gentil...rs E, sim, provavelmente, se morássemos juntos, ele assumiria todas as tarefas mais pesadas, todas aquelas coisas que para mim são verdadeira tortura, mas que o cromossomo Y dele administra com muita tranquilidade.

O que me faz ter tanto receio de dividir a vida e o espaço com alguém? Provavelmente, as experiências anteriores, quando vi diante de meus olhos, o cuidado, o carinho e a atenção se dissolverem lentamente, dia-a-dia. Quando vivemos sozinhas, assumimos todas as responsabilidades e não podemos culpar o outro pelo que dá errado. Mas talvez eu seja um modelo antigo de mulher que, apesar da independência, da força e da capacidade de me virar sozinha, ainda sente falta de ser cuidada e protegida de alguma forma. O desafio é olhar para isso como algo natural, ao invés de me sentir fragilizada ou incapaz.

Mulheres reclamam... Sempre! Independentemente do fato de terem um homem ao lado ou não. Creio que isso tem a ver com os hormônios...rs E os homens sábios, não importa a idade que tenham, olham para isso com generosidade. Prova disso foi a atitude do meu filho que diante do meu cansaço e do choro súbito (eu pensei ter perdido meu celular, mas ele estava dentro do carro), saiu de casa correndo para me acudir. Pegou todas as compras, me acalmou e com o celular na mão ligou para o meu número - surpresa! o celular tocou em algum canto debaixo do banco do carro. Ele entendeu de uma forma doce e sensível que eu gritava por socorro, que apesar de eu assumir todas as responsabilidades da casa com bravura, ainda sou uma mulher que chora porque tudo parece estar dando errado.

Isso me faz pensar que o peso que sinto sobre meus ombros, vez por outra, é resultado muito mais da minha forma de sentir as coisas, do que da omissão dos homens que me acompanham. Meu pai, sempre que o carro dá problema ou quando fervo a cabeça por algum problema, rapidamente vem em meu socorro. Ele é um homem antigo... E dos bons! Com uma autoridade benevolente que faz com que tudo pareça se resolver magicamente, ele me dá uma segurança confortável, me faz sentir protegida. Meu namorado, nestes seis meses em que estamos juntos, já me pegou no colo, literalmente, e me acalmou, quando tudo parecia perdido. Me ofereceu carinho e massagens para que o stress fosse bater em outra freguesia e já prometeu, inclusive, desentupir os queimadores do fogão, aqueles insuportáveis, que insistem em me deixar com menos opção para cozinhar. E meu filho, da mesma forma que me procura quando suas dúvidas emocionais resolvem tirar seu sono, também me ampara dizendo "calma, mãe... vamos resolver isto".

O livre arbítrio e a liberdade são coisas muito importantes para mim. Mas também sei ser grata quando sou cuidada, quando me dão colo, quando a presença masculina se apresenta para fazer aquilo que parece ser um tormento. As reclamações continuarão a existir porque, afinal de contas, sou mulher e uma mulher de 48 anos, com seus hormônios rebeldes e temperamentais, mas mesmo as reclamações duram pouco quando coloco a sabedoria para funcionar. Escolho ser feliz todo dia. E a minha felicidade depende de mim. Mas é bom saber que existem outras pessoas que também prezam por ela e se oferecem, graciosamente, para que ela se mantenha intacta. Se feliz é saber que em alguns momentos as coisas não são perfeitas, mas até a imperfeição pode ser bela quando compartilhada com quem se ama.


6 comentários:

Anônimo disse...

Cacau,
Que belo artigo!! Traga mais e mais e mais...apesar da agenda lotada!! Precisamos respirar isso!
Foi uma boa sacudida para mim, afinal, acabei me acostumando a ser independente e auto suficiente...Nem me lembro a última vez que alguém me ajudou com as compras ou alguma atividade tipicamente masculina. Verdade é que acabei me fechando a la Frozen no seu castelo de gelo seco. Mas a vida é assim: quando você não anda ou caminha com os próprios pés, ela te coloca num skate, patins ou rolimã e te taca ladeira Pelourinho abaixo. Ninguém pode permanecer na inércia afetiva por muito tempo: precisamos de alguém nos momentos de fragilidade, precisamos de amor, carinho, atenção, cuidados, colos e etc. Quem sabe não está chegando a hora de viver um novo amor? Depois de tantos sinais...
Abraços

Thaay B. disse...

Adorei!!!!

Jeruza Rosário disse...

Eita, texto belo, desperto, toca na alma... "Isso me faz pensar que o peso que sinto sobre meus ombros, vez por outra, é resultado muito mais da minha forma de sentir as coisas". Pois, a chave tá bem aqui! Boa noite, Via!

Juliana disse...

Precisava tanto ler isso hoje, Claudinha! :)
Beijos e ótima quinta. Eu te amo, sinto muito, sou grata!
Ju

Clara disse...

É Claudinha, agora você PEGOU PESADO!!!
Brincadeirinha, viu?
É que o que você falou tem TANTA RESSONÂNCIA Dentro de Mim, que parece que você escreveu para Mim ou então Somos Gêmeas Idênticas.
Nossa, tem horas que eu acho a Gente tão Parecida. Acho que já te falei Isto.
Esta da LIBERDADE x PRISÃO EMOCIONAL, Nossa, como eu tenho Questionado Isto Últimamente.
Como eu Digo para Mim Mesma:
- EU ERA FELIZ E NÃO SABIA
Sim, porque eu Sonhava Tanto em ter um Companheiro, que já me vi e ainda me vejo na COMPANHIA daquele Príncipe que Virou Sapo.
LITERALMENTE.
Como diz o Poema:
Ai que SAUDADES que Tenho;
Da Aurora da Minha Vida...
Aurora á qual me Refiro, é daquele Tempo em que eu Decidia Minha Vida.
Se Ia ou se Ficava;
Se Fazia ou deixava de Fazer;
Se Dormia ou se Acordava;
E MUITAS Outras Mais...

Mas Eu não estava FELIZ.
SONHAVA com o TAL DO PRÍNCIPE ENCANTADO.

Mas que Príncipe que NADA.
Mas Como você Disse:
TUDO É UMA QUESTÃO DE ESCOLHA.
Enfim...

Com Esta, espero ACERTAR na próxima e Perceber que eu Posso ser a MELHOR COMPANHIA para Mim Mesma.

GRATIDÃO!!!

Cacau Gonçalves disse...

Queridas, este aprendizado é diário! Quando trago para cá estas reflexões é porque percebo que não estou sozinha e vcs confirmam minha suspeita...rs Estamos juntas neste processo e isso nos dá força e sabedoria para tocar em frente.

beijos!